segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Chega





"Chega!"

Exclamava. Convencia a si mesma que dava muito trabalho, que não valia à pena. Chega; estava exausta.

E merecia aquilo? Merecia?! Soava quase como uma ameaça para os próprios ouvidos. Claro que não - era ela mesma quem respondia. Esse irritadiço monólogo de pensamentos sempre vinha na hora do banho. E não parava.

Enquanto ela se secava, concluia que se estava assim agora, por que algum dia iria mudar?

Enquanto se vestia, lembrava que nunca, nunca, conseguia deixar tudo claro e simples, sem meias palavras. Deus do céu! Será possível? Quanto trabalho!

Enquanto passava o batom cor de boca em seus lábios, pensava em todas as coisas que não podia falar com medo de dar tudo errado. Ah, mas agora ele ia ver. Ah, se ia.

Enquanto passava perfume e admirava-se no espelho, enumerava todas as vezes que ela já havia se sacrificado por aquela relação. Tinha sido uma, duas? Nããão! Milhares!

Enquato calçava os sapatos, revivia todas as conversas que não chegaram a lugar nenhum. E era culpa dela? Obviamente que não!

Enquanto ia atender a campainha, seu cérebro era um caos; era como se quisesse lembrar-se de todos os seus argumentos no pequeno percurso do quarto até a porta da frente.

Então, ela abria a porta - decidida, segura de si, dona da verdade. Via o sorriso dele e pronto.

"O que é que eu queria te dizer mesmo?"

Mulheres.


sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

No consultório


Entrei no táxi e meia hora depois estava no consultório. Não que a viagem até lá tenha sido fácil. Tive que usar todo o meu jogo de cintura para marcar aquela consulta de última hora - ou seja, falando claramente que se não me arrumassem um horário, eu simplesmente apareceria lá e faria um escândalo. A secretária pareceu surpreendentemente calma com a minha ameaça, mas depois cedeu.
Quando cheguei, fui em direção à porta do consultório, mas não sem lançar um olhar para secretária, digno de nossa conversinha pelo telefone. Ao abrir a porta, imediatamente sentei-me no divã.
- Ele não ligou.
Esperei uma resposta. Será que ele não tinha entendido? Resolvi acrescentar mais drama:
- Faz três dias - e nem em um minuto dessas 72 horas eu pensei em outra coisa. Mas isso eu não disse. Não queria parecer obcecada ou algo assim.
- Por que você não ligou?
Fiquei um pouco irritada. Eu teria que explicar tudo?
- Não são as mulheres que fazem isso.
- E como você se sente, por ele não ter ligado?
Eu não considerei essa pergunta digna de uma resposta, então resolvi mudar de assunto.
- Eu não entendo. Se você fosse ele, você ligaria?
Ele não respondeu de imediato, pareceu surpreso. Mas, afinal, era uma pergunta simples, então mantive meus olhos cravados nele. E continuei esperando.
- Ligaria? - Reforcei, e aproveitei o silêncio para dar uma sacudida no meu cabelo, sabe, dar uma ajeitada, já que ele esteve preso durante toda a viagem de táxi. Claro que meus olhos não saíram dos dele nem por um segundo.
- Você gostaria que eu ligasse? - Ele respondeu meio sem jeito. Mas ele nunca tivera muito jeito mesmo. Só demorou um instante para ele perceber o que disse e ficar ainda mais desnorteado.
Eu sorri, agradeci e me levantei. Por isso que eu tinha dois analistas. Afinal, esse aqui, mesmo sem saber de nada, acabava me ajudando, de um jeito ou de outro.